Conflito Israel x Irã: a escalada da violência no Oriente Médio
- Blenda Lara
- 14 de abr. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 15 de abr. de 2024

Nas últimas horas o mundo está à espreita da evolução do conflito no Oriente Médio. Israel atacou há semanas a embaixada iraniana na Síria, matando dois generais iranianos.
O que podemos vislumbrar desse aumento das hostilidades? Vamos conversar um pouco sobre isso.
O Irã não é o mundo árabe e com ele não se comunica tão bem quanto pode parecer ao senso comum
O Irã é o antigo e poderoso império Persa que, no passado, já se estendeu até a Turquia e o Egito, conforme pode ser visto no mapa abaixo, havendo sido dominado por Alexandre, o Grande. Após esse período, viveu sob o regime de diversos povos, incluindo turcos e mongóis.
Entre 1500-1722, a dinastia sávida, proveniente do Azerbaijão, derrubou o governo dos turcomenos e fundou um novo Império Persa. As identidades culturais, incluindo o idioma, foram estabelecidas nessa época.
Em relação aos árabes, antes da Revolução Islâmica de 1979, o Irã mantinha relações cordiais com vários países árabes. No entanto, desde então, as relações têm sido marcadas por períodos de tensão e conflito, especialmente devido às diferenças religiosas e políticas. O Irã é uma autocracia de maioria xiita e os países árabes, mesmo sendo muçulmanos, são de maioria sunita.
O Irã e os países árabes frequentemente se encontram em lados opostos de conflitos regionais. Por exemplo, o Irã é um aliado próximo do governo sírio liderado por Bashar al-Assad, enquanto muitos países árabes apoiaram os grupos rebeldes sírios durante a guerra civil na Síria. Além disso, o Irã e a Arábia Saudita, um dos principais países árabes, estão envolvidos em uma rivalidade regional que se manifesta em vários conflitos no Oriente Médio, incluindo o conflito no Iêmen.
Portanto, diante de um conflito entre Israel e Irã não necessariamente o mundo árabe ficaria ao lado da nação persa.
A Carta da ONU não autoriza um "direito de retaliação" de um país em relação ao outro com base no artigo 51
O artigo 51 da Carta da ONU fala de legítima defesa individual ou coletiva e, como tal, ela é uma resposta a um ataque atual ou iminente. Ora, o ataque ocorreu fora do Irã e, apesar de se tratar de um desrespeito às convenções internacionais o ataque de Israel, isso não confere ao Irã ou a qualquer outra nação em situação semelhante, um direito de resposta que constitua, per si, um ataque a outra nação.
À título de exemplo, a Ucrânia pode sim clamar o artigo 51 da Carta porque foi invadida pela Rússia. Só existe legítima defesa diante de fato concreto, é parecido com o direito interno.
Que reste claro: nenhum dos dois países está respaldado em suas ações por quaisquer normas internacionais.
Trata-se de reapolitik, mero equilíbrio de poderes na região. A ação de quaisquer dos dois países é mera retaliação e isso é veementemente proibido pelo direito internacional.
Qualquer outra leitura do artigo 51 da Carta é algo extremamente equivocado.
A base da ONU para casos do gênero é a solução pacífica de controvérsias
O ataque de Israel poderia ser inclusive condenado na Corte Internacional de Justiça por se tratar, dentre outras violações, uma violação à Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas. Em uma outra interpretação, também poderia ser considerado um ato de agressão nos termos do artigo VII da Carta da ONU.
A resposta deveria ser utilizar o sistema internacional para responsabilizar Israel, mas, aquela região ainda vive muito sob a égide de uma política de poder.
O conflito vai sofrer uma escalada?
O envolvimento desses dois países no Oriente Médio poderia sim trazer catastróficas consequências para a região e para o mundo todo. Os próprios líderes envolvidos sabem disso e, muito provavelmente, não irão passar de respostas e trocas isoladas de hostilidades.
Todavia, qualquer pequeno erro de cálculo naquela região pode acender um barril de pólvora.
Biden, depois da desastrosa saída do Afeganistão, não estaria disposto a bancar uma guerra na região, especialmente em ano eleitoral. Netanyahu, por sua vez, quer manter o discurso e postura de mão de ferro, a fim de prolongar seu mandato e evitar que a sociedade israelense cobre dele seus erros militares e não militares. O fato é que o primeiro ministro tragou a sociedade israelense a uma guerra sem precedentes que não se via há muito na região.
Como fica a situação interna no Irã?
Após a revolução xiita, o Irã ficou um país extremamente isolado do mundo, seria uma situação, guardada as devidas proporções, semelhante à da Coreia do Norte.
Trata-se de um povo extremamente culto e ciente da sua cultura, mas com pequena oportunidade de conhecer e se conectar ao resto do mundo. Ressalte-se: o povo iraniano não se confunde com seu governo. Não há muita escolha a quem nasce nesse país, a não ser se conformar com o regime dos aiatolás.
Recentemente muitos questionamentos internos a esse regime têm ocorrido e confrontar Israel, país cuja ocidentalização é uma "ameaça" ao estilo de vida quase medieval do Irã, é quase que uma forma de reafirmar o seu poder internamente.
Não se impressionem com as pessoas nas ruas comemorando o ataque a Israel, muitos poderiam estar lá sem saber o que fariam ou até mesmo obrigados. Aliás, o povo iraniano tem muita admiração pelo Brasil e por seu futebol.
O regime dos aiatolás é indefensável, violador de direitos das mulheres e da população LGBTQIA+. Só que a população não se confunde com esse governo autocrático.
E a posição de Israel?
Dentro dos atuais acontecimentos, fica evidente que Israel viola normas internacionais, ignora o sistema internacional e só o procura quando lhe convém.
Apesar dos horríveis atentados do 7 de outubro de 2023, nada justifica a ofensiva israelense, uma verdadeira afronta a todas as normas e princípios humanitários.
Fato é que Israel não conseguiria levar uma guerra dessa magnitude, junto com a ofensiva contra o povo palestino, razão pela qual, deverá haver uma resposta, todavia, bem pequena e nos moldes feitos pelo Irã.
Qual deve ser o posicionamento do Brasil?
O teor da nota brasileira já era esperado e caminha no sentido da busca de solução pacífica para todas as controvérsias, foi coerente com a postura de política externa adotada e, para o Brasil se envolver num conflito desse nível, algo muito grave deveria justificar. Portanto, a tendência é que fiquemos ideologicamente e geograficamente distante do conflito.
Hoje haverá reunião do G7 e do Conselho de Segurança da ONU, a pedido de Israel. O sistema internacional não pode ser algo de que um Estado participa quando lhe convém. E é isso que Israel está fazendo.
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